Antes de entrar para a universidade e de sequer pensar em estudar Línguas e Culturas Orientais, a ideia que tinha em relação aos chineses não era muito diferente da de todos aqueles não familiarizados com este povo. Os chineses eram sempre aquelas pessoas que me olhavam desconfiados quando eu entrava nas suas lojas - e eu sem saber porquê -, que trabalhavam árdua e incansavelmente e que quase nunca dirigiam a palavra a um não-chinês.
Ao longo de 5 anos (licenciatura e mestrado) a emergir na cultura chinesa, fui aprendendo não só a língua, mas também inúmeros aspetos da cultura, costumes e tradições que me permitiram perceber melhor o porquê de os chineses agirem, pensarem e sentirem de uma forma que a nós nos parece tão peculiar. Agora, já culturalmente mais consciente, e para te ajudar a compreender melhor este povo, é a minha vez de te falar em cinco das suas características mais importantes. É claro que, tal como nós, cada chinês tem a sua própria personalidade e visão do mundo que o rodeia, mas não deixa, contudo, de ser influenciado por algumas características e padrões da sua cultura em geral, fruto da educação que recebeu/recebe.
Confucionismo
Apesar das mudanças ao longo dos tempos, o Confucionismo, corrente filosófica criada por Confúcio (551-479 a. C.), continua a constituir-se como fonte de valores e código social da sociedade chinesa atual, ao mesmo tempo que exerce influência sobre os sistemas governativos, educacionais, sociais e familiares de outros países da Ásia Oriental (como o Japão e a Coreia). De cariz profundamente humanista, o Confucionismo enfatiza o valor do indivíduo e o cultivo da ética pessoal, assim como o desenvolvimento de um caráter moral superior, assente em cinco conceitos fundamentais: a benevolência/amor ao próximo (ren), o comportamento do indivíduo adequado aos padrões sociais (li), a piedade filial (xiao), a fiabilidade ou confiança (xin) e a justiça/retitude (yi). Outro aspeto a salientar é a integração do indivíduo numa sociedade hierarquizada, a qual tem por base um conjunto de relações pessoais e sociais claramente estabelecidas e ritualizadas, que deverão ser respeitadas e consideradas como algo indispensáveis ao funcionamento da sociedade. Estas relações são recíprocas, ou seja, cada um dos seus intervenientes possuí direitos e deveres sobre o outro. Outros dois conceitos bastante valorizados nesta forma de pensamento são a frugalidade e o trabalho árduo - daí a dedicação dos chineses à sua profissão.
Harmonia
De uma forma simples, podemos definir a harmonia como o equilíbrio dentro do próprio ser humano, ou o equilíbrio entre este, a sociedade e a natureza, através da conformidade às normas (humanas ou naturais). É um conceito presente nas duas principais correntes de pensamento chinesas – o Confucionismo, que enfatiza a harmonia entre os seres humanos, e o Taoísmo, que enfatiza a harmonia no Universo. O facto de os chineses valorizarem a harmonia faz com que, por exemplo, os chineses não se costumem queixar ou apontar falhas/problemas de forma muito direta.
Face (mianzi 面子)
O conceito de “face” é um valor cultural central com influência generalizada nas relações interpessoais na sociedade chinesa, sendo o aspeto público e social da imagem que o ser humano tem de si mesmo. Em relação a este valor cultural, há dois conceitos importantes a reter: a “perda de face”, causada pela falta de respeito, pelo sentimento de ser-se ignorado, humilhado ou desafiado; e o “dar face”, que significa permitir que o outro escape à humilhação implícita de não se saber ou perceber algo, de não cumprir com determinada expectativa, de se ser enganado ou se sentir inferior.
Guanxi 关系
Este termo refere-se à rede de contactos pessoais que possuímos entre os nossos familiares ou amigos. Este é um fator determinante para o sucesso na China: não importa o quão rico ou inteligente és; sem os contactos certos, verás as tuas possibilidades de alcançar determinado objetivo diminuídas por pessoas com melhores contactos do que tu. É um conceito quase comparável aos nossas contactos/"cunhas".
Coletivismo
Os chineses são profundamente coletivistas, ou seja, possuem ligações fortes a um determinado grupo com o qual mantém ligações fortes e duradouras, que podem condicionar diversos aspetos da sua vida, agindo em função dos interesses deste. Por outro lado, aquando do contacto com pessoas “fora do grupo”, os chineses mantêm uma atitude de desconfiança e, por vezes, rudeza, mostrando pouco respeito pelo outro.
Estes são apenas os exemplos mais marcantes dos valores que influenciam a atitude do povo chinês para com a vida e a sociedade. Com estas explicações, já terás algumas respostas às perguntas que te assolam sempre que tens oportunidade de contactar com chineses, mesmo quando apenas vais às suas lojas comprar aqueles pequenos utensílios que fazem falta em casa!
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